terça-feira, 27 de novembro de 2012

Pessoas Granadas, Você as Conhece?


Fui no sábado ao Teatro Municipal assistir a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, regida pelo maestro Fabio Mechetti, com a pianista convidada Sonia Rubinsky. Noite agradabilíssima. Uma Orquestra linda de se ver e ouvir, Sonia em sua eterna elegância transbordou segurança e prazer. 
Após o término, fui fazer a fila para cumprimentar a pianista. Depois, os amigos que estavam comigo, chegaram.  Ao se juntarem a mim, a mulher de trás se pôs a reclamar, com toda razão. Eu disse para ela passar a minha frente, pois assim aquela desordem se colocaria logo em ordem, de uma vez que por alguns instantes a fila terminava ali... Sem conseguir se dar por satisfeita com a zerada do problema, continuou a suspirar e resmungar numa irritação desproporcional ao tamanho do fato e ainda entrou numa competividade de poder, bem demonstrada ao me dizer com um ar de desprezo irônico, “Se eu quiser nem entro nesta fila! Posso falar com ela pelo telefone!” Pensei então: “Nossa... Estou ao lado de uma Mulher-Bomba”. Respondi que entrar naquele clima ofensivo era desnecessário, pois afinal prontamente a solução já havia sido dada, era só uma questão de troca de posição. E ainda disse, já irritado; “Se situa. Isso tudo é desproporcional.”
Passado uns três minutos quando olho ao meu redor, naquela fila já enorme, vejo a mulher esbravejante, que deve ter em torno de seus 45 anos, lá adiante no segundo lugar de espera para falar com a pianista. Fez com todos o mesmo ato de desrespeito que a tinha indignado. Neste minuto cruzou o olhar sobre o meu com um semblante de vitoriosa e então, cruzei meus pensamentos reflexivos e concluí: Vitoriosa na fila, Vencida na Vida.
De imediato, tomei-a como um dos exemplos sobre o que havia desenvolvido em aula nas duas últimas semanas “O Conflito do Eu com Isso se Torna o Conflito do Eu com o Mundo”. 
Nas aulas, falei sobre a atenção que devemos ter em se controlar com lucidez, para impedir que o conflito interno se transforme num modo de viver o mundo. Quando uma pessoa deixa de conseguir manter o conflito que a perturba numa proporção equilibrada, de modo a permitir que ele – conflito – cresça e ganhe potência para contaminar o mundo, eis o princípio da psicose que se instala.
Recalques, amarguras, ressentimentos podem nos transformar, você, eu e todos, em uma pessoa com potencial explosivo.
Quantas pessoas parecem carregar uma ferocidade devido às amarguras sem elaboração... Quantas que fazem das buzinas dos carros armas sonoras... Quantas passam dando esbarrões agressivos pelas ruas afora... Quantas nas revoltas de uma vida mal conduzida se tornam atropeladoras do prazer alheio... Quantas gostam de tratar o outro com certo desprezo... Quantas enfim estão mal nesta vida... Quantas pessoas? Muitas neste imenso mundo.
Precisamos ficar atentos consigo mesmo. Precisamos controlar esta tendência humana.
Neste mesmo sábado tinha lido no Caderno Prosa do jornal O Globo, o que José Castello escreveu em sua coluna “Quantos de nós preferimos – viver sem viver – sob as ordens de um destino precisamente escrito, entre bandos “que matam sem matar” entre “bravos que no fim se vingam”... Preferimos sim, os sentimentos... que em vez de libertar funcionam com travas...”.
Ela, a que denominei “Mulher-Bomba,” estava tomada, dominada, vencida por algum conflito de sua vida que estava funcionando como travas. Qual conflito? Qualquer resposta será pura especulação sem fundamento. No entanto, pode-se considerar que pode ser até algo que possua um peso real, mas que por falta de reflexão, ponderação e controle a contaminou, a travou. 
Por que recorro ao termo controle ao invés de elaboração? Porque a elaboração está longe de poder eliminar todos os nossos aspectos ameaçadores a vida cotidiana, mas através dela podemos conquistar a capacidade de reconhecermos o que é saudável ser vivenciado e o que deve ser controlado. Nasce o contato com a capacidade de controlar determinados impulsos... Controle sim, pois a civilidade envolve a capacidade de reprimir determinados sentimentos e determinados impulsos de agressividade, que garantem nosso equilíbrio e a qualidade em saber olhar e respeitar o outro.
Como sempre afirmo: Podemos muitas coisas, mas nem tudo que podemos devemos.
Os acontecimentos mais difíceis de nossas vidas podem nos primeiros instantes e dias invadir a nossa existência de modo até a comprometer a nossa capacidade de viver o dia, mas a atenção deve sempre ser mantida para que o desgoverno pessoal não se transforme em sentimento debilitador de nossos discernimentos e invada todos os setores de nossas vidas. 
José Castello neste mesmo sábado, nos traz um poema onde fala sobre uma enigmática aranha que transita em nós. “A beleza pode estar numa aranha que anda, sem que possamos entender seus motivos. “Sem que eu, a testemunha,/ saiba, digamos, interpretá-la”. A aranha (repugnante) expressa a dança dos sentimentos: eles se movem no escuro, dão saltos imprevisíveis e escapam a toda compreensão. A aranha ameaça e fere: ela nos atinge. Permanecemos em silêncio, com a beleza da sua dança, ainda que repulsiva. Vá se entender com o que sentimos.”
Poderíamos também pensar:
Vá se entender com que sente.
Vamos nos entender com o que sentimos.
A noite de sábado, plena de música, pessoas, num ambiente tão secular é como um vinho que derrama sob nossas taças, sob nossas almas, mas algumas já estão tão plenas de amarguras, que ficam impedidas de se embriagarem com a sensualidade destes momentos.
As almas devem ser lavadas com as reflexões e elaborações. As almas devem ser purificadas com a lucidez... As almas devem estar sempre liberadas para receber o Belo e o Bom.
Caso não o faça, ela explode como uma bomba sempre por alguma razão deslocada...
Mulheres-Bombas... Homens-Bombas...
Um Atentado... Socorro! Polícia!
Análise Neles!

Por Manoel Thomaz Carneiro

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Como Está Sua Vontade de Estar no Mundo?



Minha família por parte de mãe é muito grande. Só ela tem nove irmãs e dois irmãos, que casaram e se multiplicaram e esta progressão resultou em muitos tios-avós, tios e primos de primeiro e segundo e terceiro grau quase como uma produção em 3D espalhada por 6 estados do Brasil.
Conviver com todos é uma tarefa impossível. Sabe-se das histórias: quem casa, adoece cura, muda de emprego, de vida, no entanto tudo é sabido quase como na época dos navegantes, por cartas eletrônicas, é claro mais modernizada do que as de Pero Vaz de Caminha, mas continuam sendo apenas notícias.
Para compensar esta lacuna e atualizar nossa memória, decidiram organizar um encontro aqui no Rio e lá fomos ao grande jantar com vista para a Baía de Guanabara, pensando é lógico naqueles que ainda não conheciam esta cidade.
Durante o evento, reconheci pessoas e sobretudo conheci outras tantas. A cada um que eu era apresentado dizia: “Poderíamos estar sentados lado a lado num avião que não saberíamos da proximidade familiar que temos.”
Conversava com o namorado canadense de uma prima que não via desde que ela era pequena, quando minha mãe começou a me chamar freneticamente para que eu cumprimentasse suas primas de 80, 90 e 92 anos. Todas, sem exceção, sabiam de mim, do que eu fazia e algumas ainda me disseram que acompanham o meu Blog.
Diante de tanta lucidez e sobretudo precisão no agora, me lembrei da introdução da aula que havia dado naquela semana. Falei sobre os 15 bilhões de anos que nos separa do início do Universo, constituído de um sistema chamado Via Láctea com 100 bilhões de estrelas, sendo uma delas o Sol. Em torno dele massas, e uma delas é a nossa Terra. Nela existe 3 bilhões de espécie de vida e nós somos uma destas. 
Fazemos parte da família humana que persiste e resiste. Quantas histórias, cataclismos, doenças, guerras e apesar destes pesares a nossa espécie permanece presente, viva. Somos frutos da coragem daqueles que persistiram, dos que se reinventaram. 
Foi através de cada ato de luta pela sobrevivência de nossos milhões de antepassados que a nossa vida na terra foi mantida.
Somos 7 bilhões... Somos uma vida que sobreviveu a tudo e por isto não está em extinção.
Entre todas as espécies, somos a única que consegue criar alternativas para os limites. Os animais não podem transformar a natureza das coisas. Quando encontram eximidos os elementos necessários à vida, sucumbem pouco a pouco. Todos eles são destituídos da capacidade de encontrar um pensamento abstrato para o planejamento de alternativas de ação. Por isso, podemos ter certeza que quando uma pessoa deixa de pensar uma perspectiva de continuidade diante de um problema, age como um objeto que permanece para sempre onde é colocado, incapaz de se retirar, de se proteger, de se transformar.
Uma pessoa sem enfrentamento se coloca refém da força do destino, se faz imobilizada devido a própria descrença na inteligência criativa e transformadora que tem em si mesma, que fez possível a permanência do ser humano na terra.
Uma pessoa sem confiança nesta capacidade fica a mercê da sua inatividade e exposta a sua erosão emocional e cognitiva.
O ser humano para atravessar montanhas em épocas bem distantes no princípio, contornou, mas com a inteligência transformadora pensou, projetou e realizou os túneis. Encontraram soluções, proteção, curas... Rompeu fronteiras. 
Próteses foram criadas para potencializar as nossas capacidades. A bicicleta e o carro ampliam nosso caminhar, une distâncias; as imagens televisivas aproximam realidades; os celulares e os computadores aceleram informações; os aviões nos fizeram voadores; a medicina nos preserva; a filosofia, a psicologia e a psicanálise nos esclarecem e amplificam nossos sentimentos saudáveis.
Como se imaginar sem capacidade diante do testemunho de tanta inventividade?
Como se imaginar só e desprotegido diante de tantos recursos?
 Muitos foram mimados pelas facilidades e querem a pílula da superação...
Imagine o que seria da vida se todos diante das dificuldades tivessem se sucumbido?
Seríamos uma espécie em extinção.
Quando vi minha mãe com 88 anos num vestido lenço e a prima mais velha dela com seus 92 anos, ereta, vestida com uma nova releitura de um tailleur em preto e branco, ágeis, potentes, gloriosas e orgulhosas, pensei que estava diante desta parcela da humanidade que se reinventa em cada tempo. Construíram túneis para atravessarem as montanhas e chegaram inteiras ao hoje de cada dia.
Enxergaram os obstáculos e usaram a engenharia mental para calcular as saídas.
Uma pessoa se mantém lúcida quando quer enxergar. Fugir, fechar os olhos é ordenar ao cérebro a destruição da visão mental das coisas. O que é a senilidade senão a gradual perda de todos os contatos... Contatos com a realidade, com os recursos internos.
O termo delírium é derivado do latim “delirare” que significa “estar fora do lugar”... Quando uma pessoa se paralisa diante de uma realidade que deve ser enfrentada, quando se fixa no passado, pode-se dizer que ela delira, pois está fora do seu lugar.
Quando uma pessoa igualmente perde a vontade de acompanhar o seu tempo, que é cada hoje e imobiliza-se, ela está no delírio, pois também está fora do seu lugar.
Quando uma pessoa deixa de se reinventar, para se deixar a mercê da erosão de si mesma e com esta postura delirante em relação aos seus recursos de enfrentamento e pilares de sustentação, ela se coloca em extinção. Ela delira, pois está fora do seu lugar. Por quê? Porque o ser humano não é uma espécie ameaçada de extinção.
O “delírio” está presente toda vez que alguém se vê sem recursos para sempre encontrar boas razões de estar no mundo.
Há um tempo tinha um vizinho, que me cumprimentava sempre de modo simpático, mas sem grandes conversas. Um dia me procurou e disse que gostaria de conversar um pouco comigo.
Este senhor reservado, aceitou um chá e começou a contar que quando ainda menino, durante a segunda guerra, foi levado para um campo de concentração. Separado da sua família permaneceu apenas com um amigo. Um dia cada um estava numa fila e por intuição e alguns sopros de notícias, sentiram que um deles iria morrer. Fizeram a promessa que aquele que sobrevivesse, iria trabalhar muito, casar e construir uma família bem grande... Eliminar a possibilidade da raça em extinção. Disse-me que passou a vida renovando em si mesmo esta promessa e que como sabia da minha profissão, queria me dar este testemunho de continuidade.
Assim como ele, minha mãe, as primas dela em diferentes contextos, diante de montanhas diversas uns dos outros, se mantiveram na vida inteiros porque encontraram uma boa razão para estar no mundo.
Eu tenho sempre claro as minhas razões...
Uma delas? O Despertar para a Reinvenção da Vida. 
Você tem claro em seus pensamentos as Boas Razões?
Aproveite esta época e se prepare para um Novo Ano, um Novo Modo de Estar no Mundo.
“Infinito Enquanto Dure”.
Encontre em si a engenharia dos túneis e atravesse com a postura dos vitoriosos as montanhas de dor.
Depois?  Quem sabe... Organize um grande jantar. Para que? Comemorar As Vidas Reinventadas.
Já é uma boa razão para estar no Mundo...

Por Manoel Thomaz Carneiro

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Excesso de Peso Para o Viver?


Sábado à noite, comecei a reservar pela internet, minha ida a Londres em janeiro por três dias, a partir de Paris com duas amigas e dois amigos. Sendo que, uma está debutando na cidade londrina, o que me faz renovar ainda mais o meu desejo de retornar. Quando visito um lugar que conheço, acompanhado de alguém que está indo pela primeira vez, meus olhos reconquistam a estimulante sensação da descoberta na redescoberta. 
Começamos, depois de tudo acertado, a organizar mentalmente as nossas bagagens. Estamos com a intenção de conseguir embarcar com uma pequena valise. Desejamos eliminar das pequenas viagens, os excessos que só servem na correria para pinçar a coluna, deixar marcas nas mãos e ainda enrijecer o pescoço.
Nada mais civilizado do que conseguir fazer uma leve trajetória, sem aquelas mãos e ombros ocupados devido à falta de capacidade de minimizar e conquistar um volume altamente clean. Não é mesmo?
Quantas vezes levamos tantas coisas que nem sequer usamos, ou se vestimos é muito mais para justificar aquela peça, do que por uma real necessidade.
Fim da viagem de avião, o aguardo das bagagens e a inevitável tomada de fôlego, concentração de forças, para tirar da esteira sem titubear aquele peso imenso, que parece mais que estamos no movimento de abandono para sempre de algum mundo, do que o retorno de uma ida de três dias para Buenos Aires, Punta ou um fim de semana na Provence.
Esse desafio todo em relação a um hábito de acumular nas valises o que não será útil, me levou a pensar naquelas pessoas que acumulam dentro de si um amontoado de mágoas, raivas, invejas e faltas de épocas distantes que com isso, acabam por criar uma bagagem emocional pesada, toda constituída de dores e ressentimentos.
Carregar o peso das culpas inúteis, das acusações infantis de uma época já esgotada só faz transformar ao longo do tempo, a existência num caminhar amargo e pesado. Sabe aquela pessoa com um rosto com sinais de esforço? Esta mala é invisível, mas está lá sendo carregada pelo corpo subjetivo, já esgotado pela falta de trégua em suportar o peso que as amarguras contínuas impõem.
Já pensou aquela grande valise com roupas de 1958, 62, 66, 73, 79, 81 que se você tentar usar alguma parece de imediato datada, às vezes tão apertada que vesti-la é se abrir à construção de uma pessoa mais feia do que seria? 
Coisas datadas, que nos apertam, só nos fazem mal e entristecem a nossa alma.
A psicanalista Maria Rita Kehl em seu livro sobre ressentimento, escreve que este sentimento “não é um conceito da psicanálise. É um termo do senso comum que reúne uma constelação de afetos negativos – raiva... ruminações vingativas e amarguras. Acima de tudo, é uma queixa insistente, repetitiva que não aceita nenhuma forma de desagravo.” 
O que caracteriza o ressentimento? 
A persistência em manter. 
Dominado pela vontade de não abrir mão daquilo que pode ser até justificável e, portanto, legítimo, mas que a manutenção na memória só faz comprometer a vida.
Segundo Nietzsche, que realizou uma profunda reflexão sobre o ressentimento, é através da memória que algumas pessoas alimentam constantemente as impressões negativas. Isso, diz ele, provoca um ressentimento constante que acaba por levar a parecer muitas vezes, tudo mais grave do que a realidade da ofensa que a originou.
Se perguntarmos o “Porquê” daquela mágoa, olharemos para trás e estaremos com nosso foco na causa, que só fará realimentar o ressentimento. A grande pergunta que uma pessoa pode realizar, após um tempo de vivência e desabafo, se dá através do “Para que”... Para que conservar?...Aonde isto me leva? O que realmente ganho para a minha existência?
Muitas vezes se percebe que a causa desapareceu no tempo, mas o efeito dela a pessoa potencializa na conservação do ressentimento.
A incapacidade de perdoar o destino, está intimamente ligada à ideia infantil de que as pessoas têm que acontecer na nossa vida do modo como precisamos. A posição imatura de desejar uma vida absolutamente encantada, leva a incompreensão de que cada um acontece na vida como pode, cada um age dentro das características e limites psicológicos próprios. Se percebermos que alguém tem o dom de nos destratar e machucar? O que fazer?
Primeiro aceitar que as frustrações são desencantos, mas passam longe de ser um castigo existencial.
A aceitação passa para muitos como um sinal de passividade e fraqueza, mas ao contrário, ela simboliza potência e libertação. Ser dominado por um ressentimento que começa a pesar é se tornar refém passivo do acontecido, sem controle algum sobre a duração do efeito do mundo exterior em si mesmo. 
Um ressentimento é considerado patológico, quando sua permanência se torna muito longa.
Aprender a se desapegar, seguir em frente ou se possível evitar situações que machucam, são grandes conquistas que uma pessoa pode realizar para si mesma.
Outro dia ouvi de um amigo uma piada que pode bem ser colocada neste contexto.
- Duas irmãs entraram numa farmácia e a menor estava diante da balança de pesar e a mais velha a vendo chegar muito perto disse alto: “Não, não irmã, desvia disso! Venha pra cá! Toda vez que mamãe pisa nisto, chora muito!”
A irmã mais velha desta piada pode representar a vivência, a coisa aprendida através da experiência. O saber tirar da situação o que machuca e ficar atento a se preservar daquilo que fere. Muitas vezes podemos desviar dizendo a si ou até mesmo ao outro - “Alto lá! Isso não!”
Nietzsche, em suas longas e profundas reflexões sobre o ressentimento, falou que: “O esquecimento é uma força que promove a vida.”
Estabelecer o desafio de rearrumar as bagagens, através de uma triagem das peças inúteis e das essenciais, conservar aquelas que possam contribuir para se realizar uma viagem mais prática, confortável e bonita é a meta de qualquer pessoa com bom senso.
Uma pessoa pode comer tudo que deseja? Pode... Por que não? A questão é: depois de um tempo o corpo vai acumular e reter de forma que ao invés das reservas trazerem energia, irão dificultar o caminhar. Se movimentar irá deixar de ser algo leve.
Uma pessoa pode acumular ressentimentos? Pode... Por que não? A questão é: depois de um tempo as reservas de ressentimentos retidas irão igualmente pesar e dificultar o caminhar. 
Se movimentar também irá deixar de ser algo leve e o prazer irá se tornar comprometido.
Na verdade podemos tudo... mas nem tudo que podemos, devemos realizar sem medidas...
Tem coisas que são boas, mas que no excesso não fazem bem. Não é mesmo?
Podemos fazer malas enormes, podemos comer muito, beber muito, se ressentir muito, mas o tamanho terá um peso a ser suportado.
Que tal abrir suas bagagens e começar a realizar uma triagem? 
Retire os sentimentos vencidos... mofados... antigos e areje sua alma para que ela se sinta menos sufocada, cansada e possa com esta liberação conquistar mais espaço para o novo.
Vou a Londres. Ao mesmo lugar, mas desta vez de um modo novo. Tenho certeza que estarei no mesmo horário diante do Big Ben, mas o tempo será outro.
Assim pode ser com tudo, o mesmo lugar, mas um tempo interno renovado.
Ponha na “nécessaire” o que for essencial para viver bem e Boa Viagem pelo cotidiano das novas horas.
Está com dificuldade de fazer isso sozinho? Peça ajuda a quem já aprendeu. Diga igual aos Beatles: “HELP !” 
Tenho uma amiga que me disse um dia: “Me senti a pessoa mais civilizada do mundo quando peguei um avião apenas com uma bagagem de mão e outra altamente analisada no bagageiro”.
Um Saber que fez ela se sentir orgulhosa de si.
Fez ela se sentir muito Sabida.
Aprendeu a Retirar O Excesso de Peso no Viver.

Por Manoel Thomaz Carneiro

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Vidas: Você Sabe Saboreá-las?



Gosto muito de entrar em livrarias para olhar guias e livros de fotografias de lugares. Outro dia, folheando um sobre restaurantes, me lembrei de uma mulher que vou chamá-la de Anita, a qual fui apresentado há muito tempo. Na tentativa de encontrar um tema comum a todos para estabelecer uma afinidade, comecei a dizer naquele encontro, que uma das minhas ilhas de prazer na vida era viajar e sobretudo para novos lugares. Destinações desconhecidas me fazem mergulhar na perda das referências que me traz uma agradável sensação de desbravamento das culturas e dos paladares. 
Enquanto falava, Anita me olhou e com um pedido de licença em seu olhar, disse “Detesto viajar... Olho as fotos dos lugares e me dou por satisfeita”. Eu a interpelei um pouco surpreso: “Nem para Tiradentes?” Ela, sem o menor tom de agressividade, mas com uma franqueza respeitável, de uma vez que aquela afirmativa iria restringi-la, me respondeu – “Não gosto de viajar, não gosto de jantar fora... Não faço questão de sair do meu mundinho”.
Lembro-me bem que a partir do que ela me disse, comecei a divagar silenciosamente em minhas considerações.
Pensei Anita. Pensei esta mulher como sendo uma pessoa que ao invés de conhecer um quadro sob os olhos, acharia uma foto da tela suficiente, como se bastasse olhar o cardápio de um restaurante sem nada pedir... 
Perguntei-me: A sua alma se alimenta de que? 
Já pensou o mundo sem a curiosidade para além dos limites visíveis? O que seria de nós? 
Estaríamos morrendo das mesmas doenças da idade média e até mesmo as de épocas anteriores. Mesmo a fotografia que a saciava foi inventada por uma alma instigadora.
O mundo evolui devido a emancipação do conhecimento. O nosso mundo interno também.
O crescimento nada mais é do que se aventurar ao novo estágio: o movimento de renúncia de uma condição para ingressar em outra.
Li uma matéria no jornal O Globo, sobre um elefante na Coreia do Sul do Zôo Everland, que consegue expressar cinco palavras em coreano: olá, sente-se, não, deite-se e bom.
Como declara a repórter, é obvio que o elefante não tem noção do que diz, mas o contato intenso com os humanos expandiu sua possibilidade. 
O elefante não tem o aparelho fonador. Ele consegue dizer as palavras ao criar um meio para superar esta limitação. Colocou a tromba em sua garganta para que no sopro pudesse recriar o som das palavras... 
Se um elefante que rompe seu nicho para se defender da solidão, pois não tinha nenhum companheiro de sua espécie durante anos, estabelece um contato além do que seria o natural e consegue assimilar aspectos que não pertencem a sua natureza, imagina uma pessoa o quanto pode acrescentar em si mesma, ao estabelecer linhas de comunicação e conhecimento com outros mundos.
Atualmente a Organização Mundial da Saúde afirma que nos centros desenvolvidos, uma pessoa de 72 anos tem a mesma perspectiva de saúde que uma de 20. Nossa longevidade é fato certo no mundo atual. No entanto, viver mais deve ser aliado a viver emocionalmente bem.
De que adianta conquistar uma vida longa sem uma cognição bem desenvolvida? 
De que adianta uma pessoa ultrapassar as barreiras cronológicas dos ancestrais e ter uma precária vida mental e emocional?
Hoje se sabe que alguém que assimila mundos novos e que se mantém inserido no contexto evoluído das ideias, desenvolve mais recursos no cérebro, estimula as sinapses e potencializa a sua resiliência, ou seja, fortalece a resistência emocional. Portanto, meu susto em relação a Anita passava longe de um preconceito pelo modo de vida, mas em saber que a permanência num mundo menor é fazer com que o cérebro deixe de encontrar desafios. Deixa com isso de evoluir. É se abrir ao mau porvir, pois o futuro virá, mas a qualidade em vivê-lo depende de cada um.
O psiquismo tem uma tendência natural a inércia, ele é estimulado no encontro com o novo e depois desacelera.
O novo é que estimulou o cérebro do elefante e é evidente que qualquer elemento novo tem o poder de estimular o meu, o seu e o de todos que se aventuram ao descobrimento.
Soube tempos depois, que aconteceu com Anita o que temi quando ouvi o modo excludente com o qual se conduzia. Começou a desenvolver uma senilidade, a partir de uma depressão. Não soube temperar... Vida insossa... Alguns diriam de modo leigo: “Ah... Problema inevitável da idade”. Grande erro.
O que faz com que uma pessoa seja considerada velha? A que ficou parada no tempo. Aquela que se exclui gradualmente do mundo. A que não acompanha o fluxo dos acontecimentos.
Sabe aquele jogo de dados? Que você tira um número e conforme o lado você anda um determinado número de casinhas? Pois é... tem pessoas que andam para trás. Lançam sua sorte ao contrário do que seria favorável a si mesma.
Como disse Freud o importante é criar um mundo sobre o qual você possa e goste de viver. Toda pessoa que se fecha em si mesma, vai se “ensimesmando” e perdendo a habilidade de lidar com a vida.
Se em contato com um novo mundo até um elefante aprende a falar... Imagine o que você pode aprender em contato com um mundo além da sua realidade... 
Aliás, escrevo esta crônica em Búzios, depois de ter descoberto um restaurante que tem um chefe que se chama Máximo, que chegou aqui com seu talento e sem nenhuma experiência com o Brasil. Dada a chance por Dª Amália, proprietária de duas belas pousadas, ampliou o mundo de sabores ao acolher novos elementos. Sua arte sem fronteiras fez dele chefe de um dos melhores restaurantes que conheci na região.
Enquanto “Anitas” escolhem viver entrincheiradas nos mundinhos, há os “Máximos” da existência, que atravessam os limites e constroem a vida dos sabores. 
Pena... que alguns com o tempo se tornam “Anitas” ao invés de se tornarem os “Máximos”.
A vida que vale a pena ser vivida?
Aquela que pode ser aprendida.
Aquela que é expandida.

Manoel Thomaz Carneiro