segunda-feira, 25 de março de 2013

Pêssach | Páscoa – Ser e Fazer


Li no O Globo de domingo, 24 de março, na coluna “Dois Cafés e a Conta...” que o Colégio Nave foi reconhecido pela Microsoft como uma das 33 escolas mais inovadoras do mundo. A única do Brasil na lista. Na cerimônia, um aluno Jonathan Caroba de 17 anos foi aplaudidíssimo devido à apresentação. Ele, morador da Maré, que adora a bossa nova, é filho único de uma doméstica e de um porteiro. Nesta entrevista concedida a Mauro Ventura, afirma que “A questão é saber se colocar. Não usar gírias, se vestir de maneira adequada ao ambiente” e continua “Se você nasce na favela sua perspectiva de vida é outra. A visão é menos abrangente. Sempre gostei de teatro, exposição e cinema. Por iniciativa própria vou a locais gratuitos como o CCBB, Caixa Cultural e museus.”
O depoimento de Jonathan me levou mais uma vez a pensar durante a minha corrida no título do meu atual curso “Capacidade de Existir – Problemas e Soluções”. Percorri em minhas ponderações que a nossa “Capacidade” é de fato uma construção baseada na “Intenção”, na “Inserção” e no “Autoestímulo”. É a confecção de uma “Capa” que se coloca através da inscrição em si do Ser que você deseja se Tornar. A “Capa” na “Idade” representa a roupagem que você veste suas ideias para constituir no plano psicológico a indumentária da “Capacidade”.
A Capacidade de Jonathan, bem como a sua, a minha ou a de qualquer outra pessoa deve ser aliada a permissão que vamos nos dar as perspectivas que ambicionamos de modo verdadeiro e profundo. 
Sair de uma condição para se construir em outra pode ser o Pêssach, que comemora a saída do Egito da condição de escravidão na busca da liberdade de Ser. Na Páscoa cristã também se comemora a libertação de uma condição de amarras...
O Jonathan fez da sua existência uma páscoa através da emancipação dos contextos desfavoráveis. Ele buscou a inserção no mundo das identificações escolhidas. Sem ficar no querer queria dos indolentes, partiu em busca das frestas que seus olhos autorizados buscavam.
Olhos interditados criam as zonas cegas quanto às possibilidades... Olhos interditados impedem o mar de se abrir. 
O mar vermelho se abre como mar da vida através da força de nossos propósitos.
Nesta páscoa repense os “Jonathans” internos que podemos ser. Ele nasceu num mundo e se gerou para a existência do desejo. Soube Ser e Fazer a passagem. Fez a páscoa em si mesmo.
Se para Jonathan havia misérias, ele compensou com a riqueza dos propósitos e dos autoestímulos.
Se há misérias nas suas crenças substitua pela riqueza das boas percepções... Das boas Marés.
Realize ao menos uma páscoa em relação a sua existência, numa empreitada que a leve as Soluções no Existir.
Escolha algo, um sentimento, um limite e saia de uma condição desfavorável e faça a inserção no mundo das felicidades de liberdade. 
A vida é uma jornada pessoal de páscoas contínuas.
Feliz Páscoas.

 


terça-feira, 19 de março de 2013

Vida Boa


Fui no sábado ao Museu de Arte do Rio – MAR e gostei muito da concepção. A vista sob um dia lindo para uma região que começa a mostrar os bons sinais da revitalização, poderia ser mais aproveitada com a instalação de um restaurante e um café, onde inclusive poderíamos desdobrar nossa permanência e fazer pausas durante o percurso para melhor apreciar a totalidade.



A visita começa pelo sexto andar e nos conduz aos outros níveis com exposições muito interessantes. Podemos ver obras da Coleção Geneviève e Jean Boghici e também da Coleção Fadel, além de um acervo com pinturas e objetos com as paisagens lindas do Rio nos Séculos 19 e 20. Num dado momento, do meu percurso, havia um grupo de jovens com uniformes do museu e diante da tela chamada “La Vierge et Sa Mère” de Michel Mareau, um explicava as imagens e assim dizia: “Quando nos fragmentamos demais para pertencer totalmente aos outros, entregamos todas as partes de nosso corpo e ficamos sem recipientes internos para guardar as nossas realizações e o vazio então se instala”. Ao escutar esta explanação tão psicanalítica, senti um arroubo de curiosidade para descobrir que grupo era aquele. Confesso que havia percorrido os meus olhos pela obra em questão e esta interpretação escapou as minhas percepções.
Parei novamente e comecei a buscar ver nas pinceladas as palavras deste educador, pois já tinha me informado que se tratava de um grupo de educadores do museu... Pensei durante a minha nova observação que muitas vezes realmente precisamos do outro para nos ajudar a perceber aspectos que até sabemos, mas não vemos num determinado contexto.
Quantas e quantas vezes passamos por importantes situações de modo distraído.
Quantas vezes uma pessoa carrega as pinceladas de uma sensação da qual desconhece o significado. Vive como a tela carregada daquela realidade, mas por desconhecimento impossibilitada de ver a si mesma.
Pensei que aquela tela continha um sentimento presente em todo ser humano.
Quem que deixou numa vida de sentir aquela sensação de vazio? 
Por vezes se apresenta quente e grave por outra mais fina mais aguda, mas de qualquer modo ela sempre em algum momento se faz anunciar. 
Pensei também na interpretação selvagem, imprecisa que muitos dão ao que sentem. Pensei igualmente na interpretação que muitos dão aos outros, como se o vazio fosse o diagnóstico de uma vida fracassada.
Nascemos desabastecidos de realizações e chegamos à vida com esta fome de algo. Somos aberturas em busca.
Somos seres buscantes.
De quê? De muitas coisas... Temos muita fome existencial. Amores... Afetos... Conhecimentos... Sabores... Cheiros... Paisagens...
A Vida Boa? É aquela plena de permissão de busca e de projetos, pois sem eles podemos até ter futuro, mas ficamos sem direção.
Aprender a se alimentar na existência é aprimorar a Capacidade de Existir.
Você deve conhecer pessoas que comem muito e quando fazem um exame de sangue se deparam com um resultado que acusa uma anemia. Conclusão: comem errado. A vida mental apresenta muitas vezes um quadro semelhante. Tem muitas pessoas plenas de atividades, mas quando fazem um exame de si mesmas estão anêmicas com altos índices de carências e de vazios. Fazem o prato de cada dia com ingredientes errados... Às vezes insossos outros bons, mas repetitivos... Às vezes tão pouco de tudo...
Se abastecer é uma arte a ser aprendida e apreendida.
O cineasta Joe Wright numa entrevista falou que ao perceber que estava na porta dos quarenta, sentiu-se impelido a encontrar uma história que tivesse alguma ressonância com a nova fase da vida que se aproximava. Fazia cinema... Alimentava-se já disto, mas queria algo com um sabor diferente. Arriscou uma nova receita. Filmar “Anna Karenina” de Tolstói de um modo inédito. Transferiu a ação do livro para uma concepção teatral. A primeira cena já define, quando as cortinas se abrem para um palco vazio, como um convite a história.
Esta experiência cinemática nos narra também sobre o momento do diretor em sua busca de inovação pela transgressão de um hábito. Uma busca de uma nova conquista, de um crescimento do que faz. Sem abandonar suas atividades e nem tampouco colocar em questão as responsabilidades ou os vínculos, mudou o tempero com criatividade para se alimentar. Fui assistir e foi este aspecto teatral que mais me tomou neste filme.
Os pensamentos fixos são algemas na existência. São impedidores da boa capacidade de Existir na Vida Boa.
No sábado me alimentei destas novidades, me alimentei com a paisagem alcançada no museu, me alimentei com as telas e com as reflexões. Depois? Ah... Depois fui a Brasserie do Rosário e me fartei dos pães que lá se encontram. Alimentei minha mente com as reflexões, meu espírito com a beleza das obras pictóricas e arquitetônicas e também meu corpo com os paladares das invenções culinárias francesas. 
No fim da tarde, ainda um pequeno vazio me anunciava. Anunciava o que? A minha humanidade, que me falava que a Vida Boa exige sempre projetos para novos dias...
O Vazio? O que significa?
Significa que a sua natureza está chamando você para viver...